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O blog da Nina, menina que lia quadrinhos.

terça-feira, 20 de julho de 2010

Escrever é uma aventura constante. Conto Escritora.

Escritora. Ela cometeu um pecado mortal, resolveu escrever. Os seus livros poderiam algum dia ressuscitar o passado que se pensava morto. Margie, que era filha única do General O’BRIAN e não era afeita a área militar, poderia fazer a história da América revisitada e relida. O pentágono se dividia a favor e contra a moça. Estávamos em plena guerra fria. Era 1.974. As famílias de combatentes mortos, feridos, agentes de segurança em atividade e ladrões que participaram do macarthismo, tremiam ao ver aquele livro infantil de dez páginas com desenhos para as crianças pintarem com giz de cera. A história começou quando o gangster John Scoppeta que, ao saber que a moça era filha do melhor agente da inteligência que os americanos já tiveram naqueles tempos, impôs a lei mafiosa do silêncio à Margie. Com apenas 27 anos, calada sob ameaças de perder o emprego, a moradia e a vida, começou a ler tudo o que caía em suas mãos. Passado dois anos, começou a escrever para passar o tempo e se distrair, até que surgiu uma oportunidade de publicar um livro infantil. O editor da Edward books, uma editora com relativo prestígio editorial, que vendia livros para escolas do interior dos EUA, leu os textos da moça e a convidou para que fizesse um livro dirigido às crianças, que desenvolvesse a coordenação motora através das técnicas de pintura, estimulasse a criatividade através das cores e das formas e que contivesse uma história de simples leitura. Ela aceitou o convite. Dois meses após a publicação dos livros alguns fatos estranhos começaram a acontecer. Uma tarde, após uma ida ao supermercado, ela verificou que a sua agenda de telefones havia sumido. Procurou por toda a casa e não a encontrou. Lembrou-se do seu pai que havia morrido aos 64 anos de pneumonia, há dois anos atrás. _Filha, para a CIA não existe fechadura, não existe privacidade. Os radicais são igualmente da direita e da esquerda e, ainda temos muitos adeptos em nosso país. Os nossos ministros cedem às vontades dos mafiosos e muitas das informações que chegam até a Central vêm deles. Lembre-se sempre que o seu pai é um homem honesto e, por favor, não ceda às pressões. Talvez sua vida seja breve, talvez não. Que seja bem vivida. Sou igual a todos os pais. Não quero que você sofra o que eu sofri, mas também não quero que você sofra o que eu não sofri porque sabia que era um caminho ruim. Alguns adversários me apelidaram de otário lá na agência. Não me importo com isso porque isso é melhor do que compartilhar informações com ladrões que vão pilhar centenas de milhares de pessoas, que depois de pilhadas, vão submeter-se às manipulações deles, e vão pilhar outro tanto de gente e o país se transformará numa violência sem fim. Alguns militares tentaram entrar em contato com a Margie. Ela preferiu ficar só, mesmo sabendo que a vasculha continuaria no seu encalço. Nada encontrariam sobre ela porque ela jamais havia se entrosado no ambiente político onde a corrupção é “festa na floresta” e nem tinha tido problemas com a polícia. Ela gostava de desenho e de filosofia. O seu pai nunca a obrigou a seguir os seus passos ou os da CIA e a sua mãe era uma dona de casa que sentia um profundo respeito pelo trabalho do marido e interferia quando o marido pedia uma opinião sobre os percalços do emprego. Sua mãe morava em Seattle e ela residia em Spokane para criar os seus livros em um local retirado. Não podia de nenhuma maneira explicar a situação à sua mãe, pois colocaria a vida da sua mãe em risco. De qualquer forma, avisou que o fato de escrever estava causando problemas e pediu à mãe que se cuidasse. Pistoleiros de aluguel eram comuns na máfia. Margie era seguida por alguns senhores de idade. Eles cuidavam dos seus passos, da sua alimentação, dos seus afazeres e tentaram dissuadi-la de a não mais escrever. Falaram que sentiam saudade dos tempos melhores e que já era um privilégio para a moça não ser considerada uma opositora. Nem prostituta. O passado da história americana tinha que continuar enterrado. Margie, ainda jovem, procurou a imprensa até conseguir os seus contatos no chamado “quarto poder”. Jefferson organizou uma tropa de jornalistas homens que seriam contatos para informações claras e objetivas. As jornalistas mulheres ficariam de fora porque era uma operação de alto risco e os homens se arriscam menos que as mulheres em suas paixões. A vida da moça se transformou rapidamente e os seus contatos davam apoio moral e estratégico para ela enfrentar a situação sem colocar a sua mãe e alguns parentes próximos em envolvimentos danosos à suas vidas. Por alguns anos, as coisas funcionaram. Em 1.975, a máfia colocou agentes em relacionamento social com a sua mãe em Seattle. Margie aprendeu com a convivência jornalística alguns macetes da profissão, mas isso era pouco para aquilo que vislumbrava de terror. Resolveu jogar o jogo, apostar as suas fichas, como dizem em Las Vegas. Margie montou a sua agência informal de espionagem. Estudou os seus vizinhos, os seus amigos, os seus conhecidos e os da sua mãe. Cada vez que um daqueles malfadados senhores a seguia, ela os vigiava. Eram idosos, estavam sós, em atitudes insuspeitas nos supermercados, nos bancos, nas lanchonetes e nas livrarias. Através de conhecidos, se informava um pouco mais sobre a vida de cada um deles. Militares,políticos, empresários, profissionais liberais, policiais e bandidos com alto poder de persuasão pessoal, todos a serviço deles mesmos e dos seus interesses pessoais como se fosse uma profissão de fé e de ódio a tudo aquilo que não pertencesse aos seus propósitos. Margie recebe a ordem de visitar a sua mãe em Seattle, as passagens estão pagas. A ordem não veio de um dos seus contatos, veio de uma carta timbrada com o selo da CIA encontrada sobre o sofá da sala da sua casa. Avisou os contatos e embarcou no avião. Dentro do avião, sobre a sua poltrona de assento encontrou um pacote de lembranças de Washington. Dentro do pacote uma mensagem: A América sabe da existência do general O’BRIAN. Desceu no aeroporto de Seattle e imediatamente comunicou a mensagem aos contatos. Três horas após se reencontrar com a sua mãe recebeu a confirmação que todos os trabalhos secretos do general estavam espalhados pela América. Sem espetáculos, sem notícias. Agora toda a imprensa tem acesso aos segredos de uma época da inteligência, época da qual o general O’BRIAN, que estava dentro da agência, na sua pior época, não se contaminou. Provavelmente a imprensa macarthista dará um fim a esses documentos, mas são tantos e tão espalhados pelo país, que a história não morre mais. Margie lembra-se da frase inesquecível: _Talvez sua vida seja breve, talvez não. Que seja bem vivida.

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